O CÓDIGO DE 1836

O Código de 1836 e a incerteza das fontes [1]

(Supressão e anexação administrativa do concelho de Macieira de Cambra no século XIX, continuação)


            Com o Decreto nº 23, de 16 de Maio de 1832, foi criado o concelho de Cambra. Após esta data houve diversas iniciativas para a sua alteração, até que, o Decreto de 6 de Novembro de 1836 chega a uma nova divisão administrativa do território, aprovada pelo Código Administrativo de 31 de Dezembro de 1836. Divide o território em distritos, concelhos e freguesias. Suprime mais de quatro centenas de municípios.
Apesar das incertezas de diversos autores e fontes, e a inexistência dos mapas que deviam estar anexos ao Código Administrativo para provar os concelhos mantidos ou suprimidos, Cambra, conseguiu manter-se autónoma, conforme comprovaremos pela investigação efectuada.

As actas de sessão da câmara de Macieira de Cambra consultadas, desde o ano de 1836 até ao ano de 1844, nada revelam de alteração à administração quotidiana no concelho.
 Houve eleições e empossados os seus membros; discussão dos orçamentos; efectuou-se o “Termo de Juramento”; e os “Autos de Arrematação” de obras e impostos. Durante o ano de 1837 contaram-se 36 sessões realizadas.
Quanto às ordens imanadas do poder central consultaram-se as leis, decretos e cartas de lei, desde o ano de 1836 ao ano de 1842 e a única referência a alterações territoriais ao decreto de 6 de Novembro de 1836, em que aparece Macieira de Cambra, diz respeito à Carta de Lei de 4 de Julho de 1837, do Diário de Governo 157, de 6 de Julho de 1837, pp. 9-11, e diz o seguinte:

«[…] § 20º A Freguezia de Carregosa actualmente incorporada no Concelho de Macieira de Cambra [está escrito Combra] no Districto Administrativo de Aveiro passará, para o Concelho de Oliveira d’ Azemeis no mesmo Districto Administrativo.»

Confirma que Macieira de Cambra no segundo semestre de 1837 era concelho, e que, quando da reorganização administrativa uma das freguesias de Oliveira de Azeméis que tinha sido integrada no concelho de Cambra, retornava a Oliveira de Azeméis.
Já aludimos anteriormente à falta dos mapas anexos ao Código Administrativo de 1836, que nós próprios verificámos, primeiro na Biblioteca Municipal do Porto e depois, o mesmo livro, no Arquivo Municipal de Oliveira de Azeméis, e nada encontramos. Esses mapas distribuíam em grelha os concelhos pelos respectivos distritos. No entanto há um estudo de Fausto J. A. Figueiredo [2] na revista “O Direito” que indica, referente ao Código Administrativo de 1836, a lista de concelhos mantidos e excluídos, e Macieira de Cambra aparece como “mantida”. Ainda assim, existe uma outra fonte que não tivemos oportunidade de consultar, na Biblioteca Nacional de Portugal, e que é a: Coleccção da Legislação, promulgada em 1836, Lisboa, na Typ. De Elias José da Costa Sanches, 1836. Creio que a consulta do mapa anexo desta obra, tirará as dúvidas definitivas acerca da não supressão do concelho de Cambra.
Na bibliografia consultada para este trabalho, Ayres Martins [3], um autor local dos fins do século XIX, princípio do século XX, só faz referência à anexação de 1895-1898. Já Maria Augusta Martins de Oliveira [4], em 1939, diz que foi suprimido em 1836 e recriado em 1840. Da mesma opinião é Inês Amorim [5], que cita a fonte como sendo Francisco Ferreira das Neves [6], mas avisando para que haja uma leitura atenta das fontes.
Efectivamente, este estudo de Francisco F. das Neves parece ser a fonte primordial para quem crê ter havido supressão do concelho, mas o autor em causa não cita as suas fontes, e mesmo na anexação de 1895-1898 que efectivamente aconteceu, é desconhecida do autor, que a ela não faz alusão no mesmo estudo.
Tudo leva a crer que a supressão do concelho de Macieira de Cambra nunca aconteceu para este período.

Fontes manuscritas consultadas
AMVC, Livro de Conferências, 1834-1839, nº 14. [Disponível no Arquivo Municipal de Vale de Cambra]
AMVC, Livro de Conferências, 1839-1844, nº 15. [Disponível no Arquivo Municipal de Vale de Cambra]

Fontes impressas consultadas
Codigo Administrativo Portuguez [1836], Lisboa, s/e, 1837. Disponível na Internet: http://www.fd.unl.pt/Anexos/Investigacao/1814.pdf.
Código Administrativo [18 de Março de 1842], Lisboa, Imprensa Nacional, 1842.
Collecção de Leis e Outros Documentos Officiaes, Lisboa, Imprensa Nacional, 1836-1841, da 5ª a 11ª séries.
Collecção Oficial de Legislação Portuguesa, Lisboa, Imprensa Nacional, 1842, 1896 e 1897. [referente aos anos de 1842, 1895 e 1896]




[1] Este artigo faz parte de um estudo que efectuei em 2011 sobre as alterações administrativas no concelho de Cambra desde 1832 a 1898. Trabalho este executado (e nunca publicado), para o Seminário de “Origem e Desenvolvimento do Municipalismo em Portugal”, da Licenciatura em História da Universidade Aberta.
[2] Ver Fausto J. A. Figueiredo, in revista O Direito, Coimbra, N.º 4, 1982, p. 266 [informação gentilmente cedida pelo Professor Dr. Mário Rui da Universidade de Coimbra]
[3] Ver  Ayres Martins– Coelhosa de Macieira de Cambra, Lisboa, Typ. de Francisco Luiz Gonçalves, 1903 [livro policopiado].
[4] Ver Maria Augusta Martins de Oliveira – Monografia de Vale de Cambra, Lisboa, Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras, Universidade Técnica de Lisboa, 1939 [recolha de Álvaro H. Almeida].
[5] Ver Inês Amorim, «A reconstrução de um espaço histórico: o concelho de Cambra na 2ª metade do século XVII – fontes e metodologia», in Revista da Faculdade de Letras – História, Porto, III Série, vol. 7, 2006, pp. 149-168.
[6] Ver Francisco Ferreira das Neves, «A formação do distrito administrativo de Aveiro», in ADA – Arquivo do Distrito de Aveiro, vol. 35, 1969, pp. 37-60.

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